Meditações Pascais – 24 de maio

Ele está no meio de nós

Padre Valter Maurício Goedert

Domingo | 24 de maio de 2020

JESUS FOI ELEVADO AOS CÉUS! (At 1,9)

João, no prólogo do quarto evangelho, proclama a messianidade e a filiação divina de Jesus e, a partir de sinais, procura aprofundar a fé em Cristo caminho, verdade e vida. “No princípio era o Verbo e o Verbo estava em Deus e o Verbo era Deus… Tudo foi feito por meio dele e, sem ele, nada foi feito” (Jo 1,1-3).

Já no Antigo Testamento o Verbo de Deus fora prefigurado na Sabedoria com o eflúvio do poder de Deus, expressão puríssima de sua glória, reflexo da luz eterna, espelho nítido da ação de Deus, imagem de sua bondade (Sb 7,25-26). O autor do livro dos Provérbios descreve essa Sabedoria criadora: “Jahweh me criou, primícias de sua obra, de seus feitos mais antigos. Desde a eternidade fui estabelecida, desde o princípio, antes da origem da terra, quando firmava os céus, lá estava eu, junto dele como mestre-de-obras” (Pr 8,22-30).

O primado de Cristo é afirmado por Paulo: “Ele é a imagem de Deus invisível, o Primogênito de toda a criatura, porque nele foram criadas todas as coisas” (Cl 1,15). Na carta aos Efésios, convida a buscar a plenitude que reside em Cristo, Cabeça de todas as coisas do céu e da terra, porque, após ter ressuscitado dos mortos se assentou à direita de Deus nos céus, muito acima de qualquer principado, autoridade, poder e sabedoria, uma vez que tudo lhe foi posto debaixo dos pés, ele, Cabeça da Igreja. A carta aos Hebreus assegura que Deus o constituiu seu Filho como herdeiro de todas as coisas, pelo qual fez os séculos (Hb 1,1-2). João descreve a comunhão entre o Pai e o Filho (1Jo 1,1).

Terminada sua missão, Jesus regressa ao Pai, e deixa claro o sentido dessa partida. Na festa das Tendas anuncia: “Vou para aquele que me enviou” (Jo 7,33). Após sua entrada em Jerusalém afirma: “Por pouco tempo a luz está entre vós” (Jo 12,35). Na discussão com os fariseus, declara: “Para onde eu vou vós não podeis ir” (Jo 8,21). Ao anunciar o início da paixão de Jesus, João comenta: “Sabendo que o Pai colocara tudo em suas mãos, e que ele viera de Deus e a Deus voltava”… (Jo 13,3). Na conversa com seus discípulos, em sua despedida, Jesus é decisivo: “Agora, porém, vou para aquele que me enviou (Jo 16,5)… Volto para ti (Jo 17,11)”. A Maria Madalena, após a ressurreição, Jesus insiste: “Não me retenhas, pois ainda não subi ao Pai” (Jo 20,17).

Contudo, ele sobe aos céus não para se afastar de nossa humanidade, senão para dar-nos a certeza de que nos conduzirá à glória da imortalidade (Prefácio da Ascensão). Não se trata de “ausência”, mas de uma nova forma de presença. Pela ação do Espírito Santo, que ele mesmo derramou sobre nós, Jesus continua presente e age. Cada vez que celebramos o mistério de Jesus é ele quem preside nossa oração. Por nós, em nós e conosco continua a obra da evangelização e da salvação do mundo.

Santo Agostinho descreve essa nova situação: “O Senhor Jesus Cristo não deixou o céu, quando de lá desceu até nós. Também não se afastou de nós, quando subiu novamente para o céu… Desceu do céu por sua misericórdia, e ninguém mais subiu senão ele; mas nele, pela graça, também nós subimos” (Liturgia das Horas, festa da Ascensão).

A partir da Ascensão de Cristo, a humanidade inaugura o modo definitivo de existir. Estamos junto de Deus não apenas como criaturas redimidas por seu Filho; o próprio Filho de Deus assumiu a natureza humana e a elevou acima dos anjos, quando para sempre sentou-se à direita do Pai (Hb 1,3; 9,24).

Em Jesus Cristo a natureza humana goza de uma dignidade única; está indissoluvelmente unida à natureza divina. Em Cristo, a vida de Deus se torna nossa vida, e nossa existência se reveste da divindade. Jamais estivemos tão perto de Deus! Como Paulo, no Areópago de Atenas, podemos anunciar: “Nele vivemos, nos movemos e existimos… Somos de sua raça” (At 17,28). Com ele, ainda, exclamamos: “Quem nos separará do amor de Cristo? Nele somos mais que vencedores” (Rm 8,35-37)!

A Ascensão não constitui uma celebração de saudade de quem partiu para não mais voltar; comemora a certeza de nossa definitiva união com Deus.

HINO DA ASCENSÃO

Neste dia
o novo alimento do espírito
subiu ao céu.
Os mistérios foram revelados em teu Corpo
que subiu como uma oferta.
Bendito seja, Senhor, teu alimento!
O cordeiro nos veio da casa de Davi;
o sacerdote da descendência de Abraão,
tornou-se para nós o Cordeiro de Deus,
o novo ministro do sacrifício.
Seu Corpo é a vítima,
Seu Sangue, nossa bebida.
Bendito seja o novo sacrifício!
Do céu desceu como a luz;
nasceu de Maria, como rebento divino;
caiu da cruz, como um fruto;
oferecido ao céu como primícias.
Bendita seja sua vontade!
És a oferta do céu e da terra,
imolado e, ao mesmo tempo, adorado.
Vieste para ser vítima,
subiste como uma oferta singular,
subiste, Senhor,
levando a oferta do teu sacrifício.

Efrém, o sírio

Livro: Padre Valter Maurício Goedert – Ele está no meio de nós – Meditações Pascais

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